Músicos pintores #4: Dorival Caymmi

Acho Dorival Caymmi chato de doer. Não somente ele, mas a família inteira: Danilo, Dori e Nana entram na dança. Evidentemente, falo da música, do que eles produzem. Acho realmente entediante – ao mesmo tempo em que, paradoxalmente, não somente reconheço a importância musical dos 4 (o patriarca, mais), como chego a desconfiar que cometo um grande pecado ao achá-los chatos. Pode ser, mas, por enquanto, concordo comigo mesmo. Por outro lado, Dorival, o chefão familiar, pintava bem à beça. Era um craque, sua pintura era tão contundente quanto de aparente simplicidade. Observe isto:

Sem título - Dorival Caymmi - Dorival Caymi

Não há título, não há olhos, não há feições. Apenas o movimento da família em busca de algo – que provavelmente não será alcançado. O traço é aparentemente simples, sem rasuras, mãe grávida, pai pescador, crianças em fila. Eu, dentro de limitações críticas sobre pintura, acho um quadro genial. O primitivismo foi muito além; a simplicidade obteve algo lírico, pela citada leveza, e ao mesmo tempo narrativo. Há uma história sendo contada, que continuará num próximo capítulo. Caymmi foi certeiro.

O Nordeste é um tema de cem anos. Ou mais, se considerar que Alencar escreveu O Sertanejo mesmo sem nunca ter pisado o sertão. Virou tema literário, de fato, com o pessoal de 1930: Zé Lins, Graciliano, Raquel, Zé Américo. E, claro, seu irmão de armas: Jorge Amado. Caymmi fez, na pintura e na música, o que Jorge fez nos enredos: uma Bahia cheia de graça, beleza natural, sensualidade, gente simpática e solidária, misticismo e religiosidade. A cultura baiana – e nordestina, como um todo – é seu tema quase único.

Bahia: candomblé, pescadores, percussão – cuja origem é africanidade -, natureza, mar. Que elementos são mais necessários que esses, perguntou certa vez o próprio Caymmi. Não se sabe se o assunto é restrito pela próprias limitações do artista ou se o universo que ele reconhecia lhe bastava. Não interessa: o resultado é tão simples quanto original. Mais ou menos como sua música – só não é pintura aborrecida, chata (a meu ver, repito!). Ao contrário: é vivaz, alegre. Abaixo, o artista em ação, e diante de si personagens caros à Bahia. Caros a ele também.

 Caymmi com pincéis e telas: Rubem Braga dizia que ele foi o único a captar seu jeito de ser em uma pintura Foto: / Divulgação

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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