Músicos pintores #1: Miles Davis

Não é incomum um artista, já sacralizado em seu ofício, aventurar-se numa outra arte, nunca antes visitada por ele. E menos incomum ainda é ver gente ligada à música conectar-se à pintura, como se essa conexão fosse visível e compreendida por gente comum, desligada da criação artística. Ron Wood, dos Stones; Dee Dee Ramone, dos Ramones, Joni Mitchell e Bob Dylan deram pinceladas que foram celebradas, ora por seus fãs, ora por gente especializada no assunto. O primeiro desses aventureiros merece destaque, a meu ver: Miles Davis. Veja só o que o jazzista produziu:

Miles já havia transformado uma de suas telas em capas de disco. Amandla é um exemplo. Não consigo, e isso pode ser uma falha minha, conectar seus quadros ao jazz, como se audição e visão se misturassem numa sinestesia óbvia. Nos quadros de Miles Davis, há alguma coisa de Basquiat, e não somente algo que se conecte à negritude ou à marginalidade. O exercício da abstração, aliado ao senso de expressão subjetiva, sugere influências de Kandinsky e da arte tribal africana. AQUI você fica sabendo mais.

Miles Davis levava a pintura a sério. Ele mesmo dizia que a pintura era a música que podia ser vista, enquanto a música era a pintura absorvida pela audição. Essa ideia não é de fácil percepção, até porque o próprio músico dedicou-se à pintura por considerar sua carreira como músico terminada. Ou seja: é possível que seus quadros exprimam justamente essa angústia – mas isso, a meu ver, nada significa para quem se depara com eles. O que interessa é o que vemos; não o que o pintor quer exprimir. Estou falando o óbvio.

Jo Gelbard, pintora e professora, orientou Miles, aceitando o desafio de fazê-lo libertar-se de fantasmas que habitavam seu passado. Chegaram a criar juntos, de forma colaborativa. Ela mesma afirmava que “tentava fazer Miles ocupar a mente com elementos positivos quando não estava produzindo música.” AQUI está uma entrevista interessantíssima com ela. Tiveram um envolvimento amoroso que foi bom para ambos, tendo a pintura como leitmotiv e como consequência. Bom para os dois; bom para nós.

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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