Os ratos de Dyonélio

Os Ratos - Dyonélio Machado - Traça Livraria e SeboDyonélio Machado é autor de dois livros: o divertido e estranho O Louco do Cati, o qual li durante os tempos de faculdade – sugestão de um professor de Direito Penal -, e um outro, que se tornou clássico, Os Ratos. O grande Érico Verissimo, amigo pessoal de Dyonélio, era famoso pelas opiniões tão rigorosas quanto honestas sobre a literatura dos outros – principalmente da literatura produzida pelos amigos. Derreteu-se em elogios a Os Ratos, e, claro, havia justiça nisso, porque é um livro tão bom quanto necessário: daqueles que merecem e precisam ser relidos.

Por falar nisso, li, reli e reli, já que consta da lista de obras impostas pela USP. Imagine um romance que se passa em apenas 1 dia na vida de seu protagonista. Você pensou em Ulysses, de Joyce, certo? Claro. Mas pode pensar também em Os Ratos, porque Naziazeno é nosso Leopold Bloom, angustiado, desesperado por conta de uma dívida com o leiteiro. Eis a banalidade que, por meio da talentosa pena do escritor, gera um romance  que ilustra a época em que foi escrito.

Dyonélio Machado era comuna. Era também psiquiatra e jornalista – ou seja: juntou esses três elementos e dessa junção saiu uma história de um barnabé oprimido social e economicamente que, na agonia da dívida, vagueia como um rato pela cidade de Porto Alegre, em busca de dinheiro para comprar leite para o filho pequeno. A via crucis em busca das migalhas mostra a periferia de uma cidade e de uma sociedade que é implacável com os menos favorecidos. Ratos alimentam-se de migalhas. Os amigos do protagonista são também roedores em busca de uma oportunidade.

Os 80 anos de O louco do Cati, obra polêmica e elogiada de Dyonelio Machado

Não há um subterrâneo no qual o rato se enfurna. A superfície, compartilhada por todos, é a verdadeira opressora. Os amigos de Naziazeno, dispostos a ajudá-lo no desafio de obter a quantia, mostram-se soterrados num nicho social feito de agiotas, pilantras, aproveitadores, gente que humilha e gente que é humilhada. Tudo feito sob a ótica de um narrador afeito à psicologia profunda, capaz de analisar gestos e desejos. É uma boa amostra do que é o romance urbano que brotou no Modernismo. Vale a leitura, principalmente se você, sexto ou sétimo leitor, vai prestar vestibular em Sampa.

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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