Clarice, 50 anos

Hoje faz 50 anos que Clarice Lispector morreu. É um ícone, marca poderosa na literatura deste país. Nunca me seduziu, de verdade, embora eu reconheça seu talento e suas aparentes boas intenções. Digo aparente porque nunca se sabe realmente o que um escritor pretende. Seu objetivo não interessa, mas sim o que o leitor encontra no que se escreve, muitas vezes às avessas do pretendido pelo autor. Clarice ficará para sempre. Conheço muita gente que a idolatra, como a Virgem das Escrituras, como uma Cleópatra, uma Joana D’Arc. Enfim, a subjetividade é inquestionável, até que se proponha, democraticamente, o debate.

Comprei Todos os Contos dela. Já havia lido metade deles, na faculdade, cujos professores sempre lhe beijaram os pés. Não os censuro. Por alguns anos, livros dessa senhora vieram a lume no vestibular (Laços de Família, A Hora da Estrela, Uma Aprendizagem), e, por questões profissionais, vi-me obrigado a trabalhar com eles. Em alguns momentos cheguei a gostar de expor aos alunos as recorrentes epifanias das personagens. Clarice, penso eu, regozijava-se com epifanias, com ritos de passagem, com intrincadas situações reveladoras – ora para as personagens, ora para os leitores. Era boa nisso, tenho de concordar.

O livro em questão, todas as suas histórias curtas, vale a pena para quem quer conhecer a autora. Não, não espere bom humor em suas narrativas. Não espere a acidez irônica presente em dois de seus ídolos: Joyce e Proust, nem espere ler textos que passem longe da discussão sobre – como se chama mesmo? – ideologia de gênero. Clarice tem predileção (eu poderia dizer obsessão) pelo universo feminino. Tudo bem: era o que conhecia, e com o talento que tinha pôde explorar as vilanias às quais as mulheres foram obrigadas a se submeter durante séculos. Mas, a meu ver, até as feministas acharão a coisa repetitiva. Enfim, é uma opinião.

Clarice Lispector morreu cedo. Alguns escritores levam muito mais tempo para obter metade do respeito artístico que ela obteve em 33 anos de literatura. Por isso cá estou, mesmo não sendo seu fã, a escrever sobre ela e sobre o livro que foi lançado recentemente, trazendo tudo o que ela produziu na arte do conto. Repito: ficará para sempre, seja na memória, seja na estante (na página impressa que se abre e se compreende). Se você nunca leu nada do que ela escreveu, tente AQUI, AQUI e AQUI. São boas amostras.

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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