I Juca Pirama é um clássico do Romantismo brasileiro. Um poema narrativo sobre índios guerreiros, em que a ideia de heroísmo não só ilustrava o ideal pós-independência como valorizava o nativo histórico brasileiro, desfazendo – ou tentando desfazer – a ideia de que o europeu é superior. Mas não é sobre literatura esta postagem. Falo de música, de música de qualidade, de jazz. E de Marcelo Coelho, um dos grandes instrumentistas cujo show pude testemunhar. Aliás, chamá-lo instrumentista é reduzir sua importância e sua realização. Marcelo é professor, pesquisador, compositor.
Não sei se vocês já leram I Juca Pirama. É um poema de métrica variável, rimado, de ritmo preciso – o que, por si só, já é um prato cheio para um músico. É um poema narrativo, com vozes: pai, filho, antropofagia, fantasia, ideais. A questão é que Marcelo Coelho vai além, muito além desses elementos. Não é somente na forma poética que sua música se baseia, mas na própria literatura em si. Os elementos literários presentes no poema, algo que transcende a língua, é que geram o arcabouço composicional. E isso atrelado, num certo sentido, à música que Miles Davis trouxe à baila há quase 60 anos, com Kind of Blue: o jazz modal. Mas a base de Marcelo está em Ron Miller, professor na Universidade de Miami. Se quiser saber sobre ele, clique AQUI.
Tenho alguns discos de Marcelo. Um deles, Colagens, é essencial, jazz puro, calibrado, adulto. Certo, certo: quem ouviu disse que não é música fácil, não é para qualquer ouvido. É um erro. É um disco para ser consumido por todos os que se interessam por música, mesmo que não tenham intimidade com o jazz, com a polifonia, com o próprio jazz modal a que me referi. Uma confissão: meu conhecimento sobre teoria musical é nulo. Gosto de música, mas ignoro o processo de se chegar a ela. Minha área, como se sabe, é outra – e é justamente essa outra que Marcelo Coelho resolveu invadir, com tanta propriedade e com outro olhar. Estou lendo devagar o livro cuja ilustração está à direita do visor. Leio devagar porque assim se faz com as grandes obras: deve-se sorvê-las com o paladar puro, sem a contaminação que, para muitos, é inevitável. Eu tento evitar. Ave, Marcelo!
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