Acabei de ler a biografia de Caetano Veloso: a desautorizada, para a qual ele, o biografado, havia, anteriormente, dado o ok. Após a decisão do STF sobre a censura a biografias, o livro veio a público. Caetano já havia escrito, par lui-même, sua história: Verdade Tropical, que li com avidez, urgência, em 1998. Nem quis ler as modificações, enxertos a meu ver desnecessários, feitas vinte anos depois, quando relançaram a obra. Não me interessa. Fico com o texto original. Dessa vez a coisa muda: não estando o próprio biografado no controle da situação, espera-se que se exponham fatos que não vieram a lume – ainda.
Caetano acha que o livro é mal escrito. E sobre algumas passagens o compositor baiano tem razão. É carregado de clichês, há erros gramaticais, praticamente não tem qualidade literária – mas eis a questão: não é essa a proposta do livro, a meu ver. Os autores – Carlos Eduardo Drummond e Márcio Nolasco – não me pareceram preocupados em fazer literatura, mas em contar a história de um indivíduo que, para dizer o mínimo, é o ídolo deles. E nesse ponto, detalhar os acontecimentos, explicar atitudes, expor novidades, tudo isso, marcado por um garimpo criterioso e aparentemente honesto, faz com que a leitura do livro seja considerada essencial. Ao menos a quem se interessa pela vida de um dos ícones da MPB.
Meu último livro foi uma biografia: Os Mamíferos -crônica biográfica de uma banda insular. Senti na pele o que é trabalhar com fonte primária, usando as ferramentas disponíveis (jornais, revistas, depoimentos). Havia muito pouco material sobre meus biografados. Os biógrafos de Caetano, no entanto, tinham, diante de si, uma história sedimentada, um artista sacralizado pelo tempo e pela memória, sem contar as inúmeras publicações acerca do protagonista do livro. E o resultado, em termos de pesquisa, é assombroso. É justo parabenizar!
O Caetano Veloso que mais me interessa vive entre 1965 e 1980. Das participações nos festivais à liberdade criativa da Abertura Política, passando pela polêmica do Tropicalismo, pelos shows com Chico, com Bethânia, com os Doces Bárbaros, com a Banda Black Rio, pela inquietude criativa, pelos relacionamentos amorosos – que tanto influenciaram suas composições -, pelos conflitos com a imprensa, pelo cinema, pela caretice em relação às drogas, pelo autoexílio londrino, pelos festivais internacionais de rock (de um deles ele participou), tudo isso está lá, e muito mais, como um documento que serve para compreender quem é Caetano Emanuel Viana Teles Veloso. Sem qualquer indulgência, transpirando honestidade, o livro é definitivo. Pode falar mal, Caetano, mas os autores fizeram uma declaração de amor a você!