Quando se chega pela primeira vez a este espaço, observa-se que, à direita de quem olha, há um widget intitulado Livro do Mês. Escolha pessoal, claro, já que mando e desmando neste blogue. Vamos em frente!
O melhor livro de Vladimir Nabokov se chama Fogo Pálido: uma obra-prima sem tirar nem pôr. É daqueles livros que os escritores apreciariam ter escrito. Algo como Nostromo, de Joseph Conrad, ou A Sagração da Primavera, de Alejo Carpentier. Li os dois, em épocas diferentes, creio que num espaço de 5 ou 6 anos entre um e outro. Já não sei mais. O que sei é que relerei. Mas quero falar de Nabokov, um dos meus ídolos. E de Fogo Pálido, um dos seus livros essenciais. Antes que alguém pergunte sobre Lolita, tenho a dizer que é um ótimo livro, mas se fosse enumerar, não estaria entre os melhores do autor russo.
Para começar, Fogo Pálido é um romance policial – evidentemente fora dos padrões norte-americanos, e também distante da intelectualidade do roman policier. Foge ao padrão por alguns pontos: a metalinguagem, a erudição e ambiente acadêmico. Imagine um poema de 999 versos, escritos por um professor, John Shade. Imagine agora um outro professor, Charles Kinbote, que, usando o poema e analisando-o verso a verso, conte uma história de poder, espionagem, duplicidade sexual e morte situada no reino de Zembla que, claro, é tão fictício quanto o poema, quanto a análise e seus próceres.
É um festim narrativo, cheio de idas e vindas, de turbulências políticas, de virulências e uma certa charmosa patifaria – tudo isso marcado pela inteligência narrativa, pelos jogos de palavras, pelos trocadilhos e pela tradução magnífica de dois craques do ofício: Sérgio Duarte e Jório Dauster. Durante a leitura – eu escrevia Histórias curtas para Mariana M, quando o li -, imaginei que previra o final, mesmo com algumas armadilhas às quais me acostumei ao ler Nabokov. Errei feio, ainda bem! Não sei se o leitor entende isso.
Vladimir Nabokov morreu no dia 2 de julho, em 1977, quando eu tinha quinze anos – e ele, setenta e oito. Fogo Pálido foi publicado, pela primeira vez, no ano em que nasci, 1962. Li vários de seus livros. Gostei de todos, mas Fogo Pálido merece atenção especial. Vou, inclusive, reler.