Charpentier, o marginal

Os maldosos dizem que o maior feito de Marc-Antoine Charpentier foi colaborar com o grande dramaturgo Moliére em Les Facheux, ópera em que o escritor francês trabalhou como libretista. Música barroca de primeiríssima, embora, em sua época, tenha sido quase um marginal, porque Luís XIV o considerava “demasiadamente italiano”. Ouvir este disco abaixo, Litanies de La Vierge, ou pequenas orações em devoção à Virgem Maria, mostra que, italiano ou francês, sua música é universal, estimulante e carregada de beleza.

Dia desses, ouvi um rapper afirmar que escutar música clássica é esnobismo. A afirmação parece-me tão preconceituosa quanto dizer que o rap só tem valor porque é fundamentado em seu contrário – ou seja, a modéstia. É uma discussão tão inf´értil quanto desnecessária. A afirmação dele, entretanto, fez-me pensar: estaria a música clássica, hoje, numa posição marginal? Ainda há espaço para ela no coração da massa juvenil, como há para o rap, para o funk, para a canção sertaneja, para a música religiosa e, com menos prestígio, para o rock?

A Deutsche Grammophon, a mais antiga gravadora do mundo, está mal das pernas há muito tempo, mesmo antes de os downloads – piratas ou não – se intensificarem e se tornarem a ordem do dia. Marginal, a música clássica, em crise, não sabia o que fazer. Manter-se no referido esnobismo ou, carregada de autoindulgência, capitular diante do mercado? Os grandes int´érpretes, as sinfônicas e filarmônicas mais respeitadas, os maestros e solistas – todos, relegados ao mundo restrito do pedantismo, devem simplesmente desaparecer porque a maioria os considera elitizados?

Sébastien Daucé : la musique baroque, "une question de fascination"

Charpentier era marginal, mas continuou seu trabalho. Fez música que, hoje, é respeitada, cultuada, admirada como um autêntico barroco de estirpe nobre. Caso possam – e se interessem por música clássica -, não deixem de ouvi-lo: ainda mais pela batuta de Sebastién Daucé (este aí, acima), maestro francês fundador do Ensemble Correspondences, formado por ex-alunos do Conservatoire National Supérieur de Musique de Lyon, um dos mais prestigiados conservatórios do mundo. Aproveite!!!

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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