Periferia e vestibular

Começo agradecendo ao Revson. Mas quem é ele e por que lhe agradeço? Bem, Revson – cujo nome familiar desconheço – é leitor assíduo deste blogue e, por sê-lo, merece meu humilde agradecimento. Pronto! Pois Revson fez um comentário sobre minha postagem anterior, na qual falo sobre Chico Buarque e sua canção Tanto Mar, que homenageia a lusitana Revolução dos Cravos. Disse que o compositor carioca é passadista e, segundo suas palavras, “O mundo é dos mano, da moçada que faz música periférica”. O que isso quer dizer? Que as atenções são dirigidas aos rappers, fanqueiros e que tais?

Sobrevivendo no inferno | Amazon.com.brTalvez ele tenha razão num ponto: o apelo que, hoje, essa música periférica (termo dele) tem é inegavelmente maior do que têm as canções de Caetano, Gil e Chico (compositores mencionados por ele). É preciso, entretanto, levar em consideração a faixa etária. Inúmeros cinquentões e sessentões, cuja formação musical contou com a participação de craques da MPB, muito provavelmente ignoram quem são os emicis, os fanqueiros et alli. Uma exceção que conheço: eu.

Acabei de ler Sobrevivendo no inferno, dos Racionais mc’s. Li porque é um dos livros selecionados por um dos vestibulares mais seletivos e importantes do país, o da Unicamp. Confesso que não leria, caso não me obrigasse a tal. Apreciei o prefácio – bastante esclarecedor, diga-se – do professor Acauam Silvério de Oliveira , fundamental para a compreensão da importância social e política do movimento no qual o grupo sobressaiu (e do qual, para muitos, é pioneiro). Os textos apresentados, contudo, não me apetecem esteticamente. Não aprecio a linguagem, mas não a desmereço. Sempre é bom lembrar que literatura não é tema. Literatura é linguagem.

Reconheço a relevância social do movimento – enalteço-a, inclusive. A representatividade política dos Racionais é inegável, e deve ser louvada porque é essencial. São, como diz o título, sobreviventes de um sistema social que quer – ou queria -, calar uma voz necessária a quem nunca teve permissão para falar. Desde 2018 são publicados pela prestigiada Cia. das Letras e a edição do livro é bem cuidada, eu diria até refinada. Resta saber se alguém considera isso uma conquista ou condescendência burguesa. Enfim, com as contas no fim: vale a leitura. E, mais uma vez, obrigado, Revson!

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Antes que eu me esqueça: aos olhos de muitos, então, Chico Buarque, sim, é um autor periférico. Hoje, claro.

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Francisco Grijó

Francisco Grijó, capixaba, escritor, professor de Literatura Brasileira. Pai de 4 filhas.

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