Sou fã de Magritte, René Magritte: belga, surrealista, morto há 56 anos num dia 15 de agosto. O gênio da raça, embora menos (re)conhecido que Salvador Dalí, que sabia como ninguém autopromover-se. Magritte, mais discreto mas tão inovador (ou mais) quanto o pintor espanhol, criou um universo próprio dentro do imenso universo surreal. Suas imagens não têm aparente sentido no mundo consciente, posto que usem a geometria e a exatidão realista. Não são o que parecem ser, e essa é a premissa surreal.
A reprodução acima tem o título O Império das Luzes, de 1954: a cena noturna sob o céu diurno. Há algo de poético no quadro, algo que brota do contraste e da simetria. Se existe um pintor no século XX capaz de aproximar poesia da pintura, este é René Magritte, admirador de Lautréamont e Rimbaud – não por acaso, poetas simbolistas franceses que influenciaram o Surrealismo. Assim como a poesia se recusa a explicar o que quer (a quem quer) que seja, os quadros de Magritte nada revelam – a não ser, evidentemente, aquilo que o observador consegue ver.
A Violação é uma ideia. É a subversão do valor milenar, da distinção entre corpo e face, ambos expostos e ao mesmo tempo cobrindo um ao outro. Pediram a René Magritte que dissesse algumas palavras sobre a obra, e dele receberam “é um sorriso muito antigo”. Eis a questão: o que isso quer dizer? Explicar a frase equivaleria a envenená-la, e o mesmo pode se dizer da tela diante dos olhos. Se há poesia nessa subversão, somente quem observa poderá dizê-lo.
Um túnel ferroviário transformado em lareira é o tema de O Tempo Trespassado. O absurdo da tela – legítima, para o Surrealismo – funde movimento e direção, mas, para onde? A fumaça que brota da locomotiva dá a ideia de que tal movimento nunca cessará, com independência e tenacidade. Se o observador tenta transpor a ideia para o real, perceberá que a anomalia nada tem de artística. O que vale, claro, é a forma como René Magritte expõe o paradoxo. Eis aí a grande poesia.
Só por curiosidade: o título original desse quadro é La durée poignardé, que significa Tempo correndo esfaqueado por uma adaga. Bem, esse é René Magritte.
AQUI, o Musée Magritte. Aproveite!