Dia desses, conversando com um querido amigo, historiador de fundamentação sólida, falamos sobre a importância de Ennio Morricone para o cinema norte-americano. Uma contribuição fundamental, explosiva, um ingrediente essencial que se consolidou a partir de sua obra-prima, Era uma Vez no Oeste, de Sérgio Leone, com Claudia Cardinale que, em simbiose com o tema central da película, faz o ingresso valer a pena. Isso sem falar no casamento absolutamente insolúvel – daqueles que nem a morte separa – entre o ambiente que se constrói com a chegada da ferrovia e as tensões que ela provoca nas personagens. Obras-primas: trilha e filme. Mas não é sobre Ennio Morricone que quero falar.
Há alguns anos li – e justamente por conta da provocação de meu amigo historiador, resolvi reler – O Gênio do Sistema – a Era dos Estúdios em Hollywood, de Thomas Schatz. Na primeira leitura, a surpresa: essa ideia de que, nos áureos tempos da cinema norte-americano quem dava as cartas era o diretor é de um romantismo que beira a ingenuidade. Quem mandava, de fato, eram os chefões dos estúdios. Davam pitacos na música, no roteiro (às vezes reescreviam tudo), escolhiam atores e atrizes, norteavam a publicidade e, caso fosse necessário, até iriam para trás das câmeras.
Figuras como David Selznick, Jack Warner, Louis B. Mayer, Darryl Zanuck e Samuel Goldwyn são avaliadas, esmiuçadas, descritas a fundo. A prepotência, proporcional ao poder, era a palavra chave, e implicava que nenhum diretor escapava daquele sistema, que, engrenado, dava as cartas no entretenimento mundial. E olhe que estamos falando de diretores como Raoul Walsh, John Huston, John Ford, Alfred Hitchcock e George Cuckor – todos eles pesos-pesados na indústria. Sim, abaixavam a cabeça porque quem mandava, no fim das contas, não eram eles. A narrativa de Schatz é fluida, coisa de quem conhece o ramo com profundidade e ensina sobre ele, afinal é professor do assunto na Universidade do Texas em Austin.
Se você obtiver o livro – hoje, somente em sebos, porque ele foi editado em 1991 e, até onde sei, não teve reedição -, não deixe de ler. Claro: estou considerando que haja interesse em compreender como Hollywood se comporta hoje em dia, após o advento da tevê, do cinema digital e das plataformas de streaming. O início de tudo está lá, entre as décadas de 1930, e 1950. Há um outro livro, que aborda o sistema em sua decadência, a partir dos anos 1960, cujo título é Easy Riders, Raging Bulls – Como a Geração Sex-Drogas-e-Rock’n’roll salvou Hollywood. Esse eu estou lendo. Seu autor é Peter Biskind e em breve falo sobre ele. Ele, claro, é o livro que, a propósito, não está esgotado.