Consta que o notável escritor norte-americano Donald Barthelme leu Epitaph of a Small Winner, do não menos notável Machado de Assis. Para quem ignora, Epitaph of a Small Winner é conhecido por nós, brasileiros, como Memórias Póstumas de Brás Cubas, o mais ousado dos romances do autor carioca. Consta que a partir de então foi aos contos, e leu vários deles, envolvendo-se cada vez mais com a narrativa do brasileiro. Li vários livros de Barthelme, e identifico pouca coisa em comum com Machado de Assis. Exceto, claro, pelo que vou escrever.
Escrevi sobre Barthelme nos primórdios deste blogue, há dois anos. Falei sobre O Pai Morto, uma novela deliciosamente sarcástica sobre a função paterna e de como ela deve ser questionada. Não sei exatamente por que figuras como Barthelme, o mexicano Juan José Arreola e o hippie Richard Brautigan são solenemente ignorados pela editoras brasileiras. Já escrevi sobre isso também. Mas não é sobre eles que quero falar. Ontem, dia 23 de julho, fez 30 anos que Donald Barthelme deixou este mundo. Não, não é uma metáfora. Ele morreu mesmo. Mantém-se vivo, entretanto, para aqueles leitores que creem na estranha fusão entre autor e obra.
Barthelme nasceu 23 anos depois de Machado de Assis ter morrido. Conheceu sua obra em 1972, quando o autor carioca era um defunto de 64 anos, e Barthelme, já escritor maduro aos 41, tinha publicado Come Back, Dr. Calligari, Unspeakable Practices, Unnatural Acts, City Life e o ótimo romance Snow White. Em outras palavras: se há alguma influência machadiana em suas obras, ela aparece nos livros seguintes – e mais principalmente em O Pai Morto, afinal o dito cujo, sendo carregado pelos filhos para o próprio enterro, passa a questionar se deve ou não continuar neste mundo. Isso sem falar no inabalável poder de quem está morto.
Poder, eu disse? Sim, já que aos mortos tudo é possível. Pelo menos é o que nos aponta o narrador das próprias memórias, Brás Cubas – ou o Small Winner, que despertou a curiosidade de Barthelme e que, possivelmente, inspirou-lhe a história de O Pai Morto. Se não, tudo bem. Para efeito de postagem – a minha! -, afirmo que sim. E enquanto afirmo, vou rezando (gerúndio adequado) para que os outros livros de Donald sejam traduzidos para a língua de Joaquim Maria. Quem sabe o que será do futuro?